chove

A chuva cai.
Os telhados estão molhados,
Os pingos escorrem pelas vidraças.
O céu está branco,
O tempo está novo.
A cidade lavada.
A tarde entardece,
Sem o ciciar das cigarras,
Sem o jubilar dos pássaros,
Sem o sol, sem o céu.
Chove.
A chuva chove molhada,
No teto dos guarda-chuvas.
Chove.
A chuva chove ligeira,
Nos nossos olhos e molha.
O vento venta ventado,
Nos vidros que se embalançam,
Nas plantas que se desdobram.
Chove nas praias desertas,
Chove no mar que está cinza,
Chove no asfalto negro,
Chove nos corações.
Chove em cada alma,
Em cada refúgio chove;
E quando me olhaste em mim,
Com os olhos que me seguiam,
Enquanto a chuva caía
No meu coração chovia
A chuva do teu olhar.

novembro/65

 .

CESAR, Ana Cristina. Inéditos e Dispersos: poesia/prosa [1985]. In: ______. Poética. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. p. 140.

.

Ana Cristina Cesar (1952-1983), também conhecida como Ana C., foi poeta, jornalista, tradutora e crítica literária. Graduada em Letras, foi mestre em Comunicação e em Tradução literária. Teve publicados vários livros de poesia e dois livros de crítica literária. Em suas poesias, Ana C. mantém uma linha tênue entre o ficcional e o autobiográfico, o que dá um ar intimista às suas obras.